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29/01 – Dia da Visibilidade Trans

Para marcar o Dia da Visibilidade Trans, lembrado em 29 de janeiro, a SBEM divulga 10 Fatos e Fakes sobre transgeneridade, que você pode ver abaixo. 

1 – FAKE – Uma pessoa que se identifique como transgênero possui um distúrbio psiquiátrico.

A identidade de gênero divergente da designada ao nascimento não é considerada um distúrbio psiquiátrico. Estudos mais recentes correlacionam a existência de distúrbios psiquiátricos nesta população à ocorrência de vivências discriminatórias e violência sofrida, não sendo esta identidade uma doença psiquiátrica. Baseada nestes estudos, a OMS alterou o nome para “Incongruência de Gênero” e passou a condição para o capítulo 17 – Condições relacionadas à saúde sexual (CID HA60, HA61 e HA6X). Com isso, o termo transexualismo e travestismo deixam de existir no novo código e também não devem ser utilizados, por dar uma conotação patológica. Situação análoga ao ocorrido com a homossexualidade décadas atrás.

2 – FATO – Devemos oferecer atendimento multiprofissional para transição de gênero.

A portaria 2.803 do Ministério da Saúde, assim como a diretriz da Sociedade Americana de Endocrinologia, preconiza a atenção integral à saúde para população transgênero, através de atendimento em equipe composta por: profissional da saúde mental (psicólogo/psiquiatra), assistente social, enfermeiro e médico que irá conduzir a hormonização. Desta forma, o indivíduo pode ser visto e cuidado nas suas múltiplas características e demandas.

3 – FAKE – Se a pessoa transgênero ainda não fez retificação do nome, devo então chamá-la pelo registro civil.

As orientações atuais defendem a utilização do nome que o paciente entenda condizente (nome social) em todas as suas identificações (receituários, pedidos de exames, etiquetas, imagens, laudos), caso por ele solicitado, mantendo-se no cadastro interno as informações completas, de forma que seja possível identificá-lo. Está reconhecida a constitucionalidade do direito à proteção à identidade e ao nome da pessoa transgênero. A adoção desta postura permite manter a dignidade do paciente e evitar a discriminação em espaços de promoção e proteção da saúde.

4 – FATO – A terapia hormonal de afirmação de gênero pode ser oferecida a pessoa trans, travestis e não-binárias.

A portaria 2803 do Ministério da Saúde normatiza a atenção integral à saúde da população transgênero, incluindo as travestis (identidade feminina para a qual devemos usar sempre pronomes femininos).

Pessoas não binárias são indivíduos que não se identificam nem com o masculino nem com o feminino, ou que se identificam com um pouco de cada um deles. Algumas dessas pessoas podem desejar o uso de hormônios para modular algumas características sexuais secundárias binárias.

5 – FAKE – A terapia hormonal de afirmação de gênero aumenta o risco de câncer.

Trabalhos científicos evidenciam que não há risco aumentado de câncer nas pessoas em terapia hormonal de afirmação de gênero, porém foi observado aumento do risco de neoplasias relacionadas ao tabagismo, obesidade e infecção pelo HPV e HIV. Recente, uma publicação avaliando dados de 2.260 mulheres trans em terapia hormonal, acompanhadas em média por 18 anos, identificou maior risco de câncer de mama em relação a homens cisgênero, porém muito inferior ao de mulheres cis.

Nas mulheres trans em terapia hormonal, o risco de câncer de próstata é menor do que o dos homens cisgêneros da sua família. Para os homens trans, o risco de câncer de mama reduz, mas não é abolido, mesmo com a mastectomia bilateral. Deve ser feito o rastreamento de pessoas trans que tenham mamas com mamografia a cada 1-2 anos, a partir dos 50 anos. Os homens trans mastectomizados devem ser rastreados apenas por exame físico.

Não devemos ignorar que homens trans podem usar suas vaginas sexualmente e, por isso, devem seguir o mesmo rastreamento para câncer de colo de útero que as mulheres cis. No entanto, a retirada de ovários e útero depende do desejo do indivíduo, não havendo indicação médica profilática pelo risco de câncer. Deve ser considerada a histerectomia total no caso do indivíduo ser submetido à cirurgia de afirmação de gênero.

6 – FATO – A terapia hormonal de afirmação de gênero aumenta o risco de trombose em mulheres trans.

Já está bem documentado cientificamente que o uso de estrógenos aumenta o risco de complicações trombóticas em mulheres cis. O uso de estrógenos em mulheres trans também aumenta este risco, sendo maior com o uso de etinilestradiol e menor com o uso de estrógeno por via transdérmica ou valerato de estradiol oral.

Mulheres trans tiveram maior taxa de AVC (2,42 (1.65-3.42) e 1,80 (1.23-2.56) 95% CI), eventos tromboembólicos (5.52 (4.36-6.90) e 4.55 (3.59- 5.69) 95% CI), quando comparada a mulheres e homens cis respectivamente e maior risco de IAM (2.64 (1.81-3.72) 95% CI) quando comparada a mulheres cis. O tabagismo associado aumenta ainda mais o risco de trombose.

7 – FAKE – Quanto maior a dose de hormônios, mais satisfatórios são os resultados.

O grau de feminização ou masculinização alcançado por um corpo transgênero em transição hormonal depende do seu potencial genético e da dose adequada de hormônios. Doses excessivas aumentam o risco de efeitos colaterais sem garantir mais feminização/masculinização.

O tamanho final das mamas com hormonização cruzada, assim como a quantidade de pelos corporais/barba, dependem das características familiares que podemos observar nos homens cis e nas mulheres cis da família daquele individuo.

8 – FATO – É possível ter orgasmo com a neovagina.

A cirurgia de feminização genital nas mulheres trans envolve a remoção do penis e testículos e a criação de uma neovagina, grandes lábios e clitóris. Existem algumas técnicas, sendo a mais utilizada a inversão peniana (usa-se pele do pênis para formar a parede da neovagina).

A glande é preservada para construir o neoclitóris, assim preservando a sensibilidade local e resposta sexual. A vesícula seminal e próstata são mantidas, permitindo além do estímulo orgástico, também ejaculação, que apesar de reduzida pelo bloqueio da testosterona, pode acontecer.

9 – FAKE – Devo associar a progesterona para aumento das mamas em mulheres trans OU inibidores de aromatase para reduzir as mamas de homens trans.

A progesterona pode ser associada para reduzir a sensibilidade das mamas em desenvolvimento, ou pelo menor custo das pílulas combinadas, mas não levam ao crescimento adicional.

As mamas de homens trans reduzem com o uso de testosterona e não há redução adicional ao associarmos o uso de inibidores de aromatase.

10 – FATO – Uma pessoa trans pode ser homossexual, heterossexual, bissexual, pansexual…

A identidade de gênero refere-se ao modo como a pessoa se identifica perante si e à sociedade, tendo o papel e características relacionados àquele gênero expresso. A pessoa transgênero é aquela que se identifica e deseja expressar-se com gênero diverso do designado ao nascimento.

Já a orientação sexual é o modo que a atração sexual ou afetiva daquela pessoa se dirige, sendo própria dela e não uma escolha. Esta orientação pode ser diversa e não tem relação com a identidade de gênero, assim como em pessoas cisgênero.

Consultoria: DEFAT (Departamento de Endocrinologia Feminina, Andrologia e Transgeneridade) – Dr. Alexandre Hohl (presidente) e Dra. Karen de Marca, a Comissão de Diversidade, Equidade e Inclusão – Dr. Bruno Ferraz, presidente – e a Comissão de Campanhas – Dr. Emerson Cestari Marino e Dra. Lorena Guimarães Lima Amato. Comissão de Comunicação Social – Dr. Ricardo Meirelles. Gestão 2021/2022.

 

Referências

– World Health Organization. WHO/Europe brief – transgender health in the context of ICD-11 (acesso em 07/11/21, disponível em https://www.euro.who.int/en/health-topics/health-determinants/gender/gender-definitions/whoeurope-brief-transgender-health-in-the-context-of-icd-11) – tradução livre

– Diário Oficial da União; Poder Executivo, Brasília, DF, 21 nov. 2013. Seção 1, p.25-30 (https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2013/prt2803_19_11_2013.html)

– JCEM (2017);102:3869-3903

– Provimento número 73 de 28 de junho 2018. Conselho Nacional de Justiça

– Curr Radiol Rep (2018) 6:1;

– De Blok C.J.M, Koen M.A., Dreijerink K.M.A, Martin den Heijer. Cancer Risk in transgender people. Endocrinol Metab Clin North Am.2019 Jun; 48 (2):441-452.;

-Braun H, Nash R, Tangpricha V, Brockman J, Ward K, Goodman M. Cancer in transgender people: Evidence and methodological considerations. Epidemiol Rev. 2017 Jan 1;39(1):93–107.

– Am. J. Hematol. 92:204–208, 2017

– Nota NM, Wiepjes CM, De Blok CJM, Gooren LJG, Kreukels BPC, Den Heijer M. Occurrence of Acute Cardiovascular Events in Transgender Individuals Receiving Hormone Therapy: Results from a Large Cohort Study. Vol. 139, Circulation. Lippincott Williams and Wilkins; 2019. p. 1461–2.

 

FONTE: site da SBEM Nacional